…Praia do Norte, Costa da Caparica…
…quase não me lembro a última vez que estive aqui…
…houve tempo na minha adolescência em que bastava haver
uma nesga de sol a partir Abril para vir acampar fins-de-semana e férias
escolares com a malta para o parque da Orbitur, até que o Verão durasse…
…tempo antes de começar também a dar saltadas ao Algarve
e mais antes ainda de descobrir e me apaixonar perdidamente pelo litoral
alentejano, selvagem, ainda praticamente deserto de forasteiros,
comparativamente com o que se passa agora…
…é cedo, oito e pouco da manhã, dia de semana a meio em
final de Setembro, tempo ligeiramente nublado e temperatura longe do braseiro
de Agosto…
…condições que
fazem estar a praia como gosto: quase vazia e sem um calor infernal…
…e que fizeram aproveitar dois dias de férias em atraso
para vir matar saudades da areia debaixo dos pés, do sabor do mar salgado, do
cheiro da praia, do sol a bater dócil na minha pele desabituada da sua intensidade…
…com os “velhos” Longboard azul-escuros vestidos, caminho
desde meio do areal molhado em direcção à água, um ultimo olhar para trás,
fixando um ponto de orientação onde deixei a toalha…
…sinto a brisa matinal, uma aragem fresquinha que me
percorre a derme…
…a espuma das ondas gorgoleja à volta dos pés, no
vai-e-vem da maré, que sobe pelo corpo acima… tornozelos, coxas, cintura…
devagar… gozando a frescura da água, salpicando-a por todo o tronco, num
arrepio agradável…
…o mar está bom, “picadinho”, com ondas certas, maré em
enchente… sempre preferi um mar com ondas a um “mar chão”… sentir a força do
mar em cada mergulho, em cada braçada, admirar e fruir a sua transparência
azul-esverdeada…
…lanço-me à agua de cabeça em sentido longitudinal, membros
esticados, em salto de peixe, experimentando de novo aquela maravilhosa
sensação de sentir aquele friozinho especial do mar da Caparica no corpo todo…
…submerso, vejo a areia e pequenas algas passarem difusas
por baixo de mim, durante dois ou três batimentos de pernas…
…venho à tona,
inspirando fundo, desvio o cabelo, que está mais comprido que o habitual, dos
olhos… “estendo-me” num dos prazeres mais simples da vida…que é apenas
deixar-me flutuar, como agora… com o conforto do balanço das ondas e o infinito
em cima…
…abandono-me por minutos deitado neste colchão liquido e
firmo depois as pernas na areia…
…o Atlântico bordeja-me as ancas e as ondas continuam
rolar cíclicas na minha direcção…em intervalos mais ou menos regulares…um após
outra, numa cadência que descobri que já há muito tempo atrás, em que ficava
tempos infinitos, sentado na praia, a olhar o mar na sua força e majestosidade,
a desfazer-se em suave espuma quando chegava até junto de mim…
…as ondas a erguerem-se , uma após outra, em contagem
progressiva até à sétima… a onda maior da sequência…
…olho o horizonte e revejo momentos antigos da minha
memória… encadeados em cada onda cuja rebentação se desfaz no areal e que vou
enumerando neste momento e associadas nas minhas lembranças…
…uma…
…duas…
…três…
…quatro…
…cinco…
…seis…
…até à onda-rainha que se aproxima… a sétima…
…em formação ao longe, depois a erguer-se lenta mas pungentemente
acima de tudo… num som surdo a principio, até quase parar no tempo, suspensa frente
de ti, numa enorme parede translucida pronta para me engolir… e eu pronto para
abraçá-la com prazer, enquanto ela ruge em meu redor, desfazendo-se depois até
se silenciar em murmúrios a caminho da
praia, molhando gradualmente a areia seca, no compasso da maré-cheia…
…ela aí está de novo à minha frente e eu, ansioso,
satisfeito, entro nela…
…a sétima onda é a mais forte da rebentação, a que te faz
sentir o corpo vibrar, a que te faz estremecer e sentir a felicidade intensa
mas efemeramente curta e eterna também, como o vislumbre do olhar da mulher que
amas quando lhe provocas um doce orgasmo…
…e foi assim que ela passou por mim e eu por ela, uma vez
mais, como muitas coisas na minha vida, intensas e curtas… como certas coisas
que gostava muito de manter tão intensas também, mas mais duradoiras…
…regresso devagar à toalha e deito-me prazenteiramente,
deixando-me acariciar pelo sol que esse é eterno… (pelo menos, até ver…)
JP ®
Sting - Love Is The Seventh Wave
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