terça-feira, 30 de abril de 2013

Pérolas 041



(…arrancado da alma e dos destroços do coração...brutal…simplesmente brutal...)

When you were here before
Couldn't look you in the eye
You're just like an angel
Your skin makes me cry
You float like a feather
In a beautiful world
I wish I was special
You're so fucking special
But I'm a creep, I'm a weirdo
What the hell am I doing here?
I don't belong here
I don't care if it hurts
I wanna have control
I wanna a perfect body
I wanna a perfect soul
I want you to notice
When I'm not around
You're so fucking special
I wish I was special
But I'm a creep, I'm a weirdo
What the hell am I doing here?
I don't belong here.
She's running out the door
She's running out
She run, run, run, run
Run
Whatever makes you happy
Whatever you want
So very special
I wish I was special
But I'm a creep, I'm a weirdo
What the hell am I doing here?
I don't belong here
I don't belong here

In “Creep” – Radiohead

quinta-feira, 25 de abril de 2013

…a nossa lua…

Está enorme e linda hoje…

Amarelo pálido, num céu límpido de Primavera a prometer Verão…

Quase que a posso acariciar com as mãos, de tão perto que parece de mim…

E tão longe ao mesmo tempo…

Como também longe daqui a devem ver como eu…

Como se fosse um enorme espelho nocturno, monumentalmente erguido nos céus…

Onde vislumbro, quiçá em alucinação minha, uma silhueta morena, um sorriso, uma lágrima…

Ou então é apenas, cientificamente, o satélite natural do planeta onde habita o meu corpo…

Porque a minha alma anda, ainda e de novo, perdida por aí, sem rumo certo…

E o que julgo ver nela, lá no alto, já não existe…

quarta-feira, 17 de abril de 2013

…quanto mais conheço as pessoas, mais gosto dos animais…

JP ®
                                                         Luffy e eu…

“Há no generoso e abnegado amor de um animal qualquer coisa que vai direita do coração daquele só teve oportunidades frequentes de experimentar a mesquinha amizade e a frágil fidelidade do Homem” – Edgar Allan Poe in “The Black Cat” (1843).


Pérolas 040



(...existem canções que encaixam na perfeição na estória de parte da minha vida...)

You are far
When I could have been your star
You listened to people
Who scared you to death, and from my heart
Strange that you were strong enough
To even make a start
But you'll never find
Peace of mind
Till you listen to your heart

People
You can never change the way they feel
Better let them do just what they want
For they will
If you let them
Steal your heart from you
People
Will always make a lover feel a fool
But you knew I loved you
We could have shown them all
We should have seen love through

Fooled me with the tears in your eyes
Covered me with kisses and lies
So goodbye
But please don't take my heart

You are far
But I'm never gonna be your star
I'll pick up the pieces
And mend my heart
Maybe I'll be strong enough
I don't know where to start
But I'll never find
Peace of mind
While I listen to my heart

People...


But remember this
Every other kiss
That you ever give
Long as we both live
When you need the hand of another man
One you really can surrender with
I will wait for you
Like I always do
There's something there
That can't compare with any other

You are far
When I could have been your star
You listened to people
Who scared you to death, and from my heart
Strange that I was wrong enough
To think you'd love me too
I guess you were kissing a fool
You must have been kissing a fool


In “Kissing A Fool” – George Michael


…a maior alma do mundo…

JP ®


…é facil falar dela e ao mesmo tempo insuficiente tudo o que possa dizer sobre ela…

…conheço-a desde sempre e também ela me conhece melhor que ninguém porque foi ela que me trouxe a este mundo…

…a minha mãe…

…posso, obviamente, ser suspeito, mas acho que não conheço uma pessoa que não goste dela… alias, acho quase toda a gente a adora, depois de a conhecer…

…talvez por simplesmente irradiar dela uma sensação de luminosidade e confiança que apenas as pessoas verdadeiramente plenas de bondade e de sinceridade, verdadeiras, solidárias e sábias, sabem fazer sentir naqueles que, por destino ou acaso, se cruzam ou entram na sua vida…

…falar dela na minha vida é, naturalmente, falar em todas as coisas importantes e de valor que ela me incutiu… e se existir alguma coisa de bom (se é que existe…) que possam os outros encontrar em mim e no meu caracter, de certeza que foi ela quem o plantou e fez germinar em mim…

…por vezes até o terá feito com alguma dificuldade, porque admito que também não fui o solo mais fácil de arar e receber boas sementes, já que tive durante o meu crescimento a minha dose intrínseca de rebeldia teimosa e de certo que lhe provoquei algumas preocupações… algumas delas perfeitamente evitáveis, vistas à distância dos anos que me fizeram chegar até ao presente, mais velho, talvez mais maduro, porventura não tão sábio como gostaria de ser…

…no entanto, no meio de toda essa tarefa árdua que em parte lhe dei (“quem tem filhos, tem cadilhos”, diz o ditado popular), sempre e mesmo nas alturas mais difíceis, sei que sempre teve confiança em mim para encontrar o melhor caminho nas diversas encruzilhadas do meu caminho… e essa confiança, que talvez também eu tenha sabido “conquistar”, agradeço-lha eternamente (como em tantas outras coisas…) porque me fez saber desde muito novo a usar o meu livre arbítrio e a fazer por resolver a minha vida sozinho…

…é de certeza uma das pessoas mais honestas e lutadoras que conheço, por toda a minha vida que tenho em comum com ela e também pelo que vim a descobrir da vida dela antes de eu nascer…

…não conheço ninguém, mas ninguém mesmo, que sempre como ela pusesse tanta vez os que lhe são queridos à frente de qualquer prioridade sua… muitas vezes para seu prejuízo ou dor… e muitas vezes também, infelizmente, sem que muitas dessas pessoas sejam reconhecedoras, gratas ou simplesmente conscientes ou sensibilizadas dessas suas nobres atitudes… é muito, muito triste dizê-lo, mas existem pessoas que não a merecem ter como familiar e como amiga…

…abdicou de muito na sua vida em vários termos (educacional, profissional, lazer, etc.) desde menina ainda, em prol e sacrifício de pais, irmãos, marido e até dos filhos, a quem sempre transmitiu os melhores valores, conhecimentos e um incomensurável amor…

…em termos de capacidade intelectual (apesar de lhes terem “roubado” espaço para progredir mais) e de sentido intuitivo, raramente encontrei pessoa como ela, sempre sagaz, sensível e muito à frente em termos de pensamento e acção em relação à maioria das pessoas da sua geração e até mais novas…

…é um eterno e incontornável pilar de toda a família, um coração ardente e sem tamanho mesurável, farol para quem sempre se voltam cada vez que qualquer mínimo ou grande problema ou crise exista… quando muitas das vezes, sei-o bem, quando precisou ela de alguém quase ninguém disse presente…

…a noção de família, como a entendo (e que, infelizmente e por saturação de hipocrisia constante, fiz por perder em grande parte, excluindo a minha família nuclear), foi ela que me transmitiu, assim como foi ela que muitas vezes aguentou todos os alicerces do que, nessa vertente, por vezes pareceu perto de desmoronar…

…tempos mais doces no seu caminho também os teve, naturalmente, e de certeza que foi muito feliz em muitos momentos da sua vida (até porque, na sua simplicidade maior, nunca precisou ou quis muito mais que paz, amor e saúde para si e para os que lhe são queridos para ser feliz)…

…mas até nisso o destino foi tremendamente cruel com ela, agora que merecia um resto de uma vida de muita luta e sacrifício, vivido com suave descanso e agradáveis dias no seu cantinho… a tortuosa e inexoravelmente dolorosa doença do seu sempre amado companheiro de vida e meu pai, veio roubar-lhe esse pequeno tesouro que seria um final de vida sossegado e em paz…   mas mesmo assim segue o seu caminho estoicamente, sem que ouça dela queixumes e com uma fé que muito admiro, embora eu esteja cada vez mais longe de compreendê-la no que me diz respeito, devido a tanta situação injusta que tenho observado e vou continuando a ver à minha volta neste mundo…

…nos últimos tempos, contudo, houve uma alegria maior na sua vida, que veio amenizar um pouco essa sina… algo que nunca lhe dei (e sei que sempre quis e merecia muito), mas que o meu mano se encarregou de oferecer: um neto, que a faz rir e vibrar como uma menina e lhe deixa os olhos a brilhar, ora de felicidade, ora de emoção…

…hoje, 17 de Abril, é o dia do seu aniversário…

…eu queria ofertar-lhe tudo o que pudesse e não consigo (infelizmente) nesse mundo para senti-la bem e sabê-la feliz, mas pouco mais lhe posso dar que o meu desmedido agradecimento, o meu eterno amor e regozijar-me pela fortuna que tenho em tê-la como minha mãe e amiga…     

…apesar de todos os meus defeitos, sei que ela tem muito orgulho em mim e, naturalmente, no meu irmão, como seus filhos… mas ela pode ter a certeza que muito mais orgulho tenho eu que ela sinta isso por mim até hoje…

…tudo o que poderia verter aqui em palavras para significar o que esta pessoa é na minha vida é imensamente limitado, tão simplesmente porque é impossível traduzir em palavras sentimentos incondicionais ou tentar explicar a essência da maior alma do mundo: a minha muito amada mãe…  
JP ®

Pérolas 039



Unofficial music video de "Santa Maria (Del Buen Ayre)" - Gotan Project
Cena do filme "Shall We Dance?" (2004), de Peter Chelsom, com Jennifer Lopez e Richard Gere


domingo, 14 de abril de 2013

Pérolas 038





Man gets tired
Spirit don't
Man surrenders
Spirit won't
Man crawls
Spirit flies
Spirit lives
When man dies

Man seems
Spirit is
Man dreams
The spirit lives
Man is tethered
Spirit free
What spirit
Is man can be

What spirit
Is man can be
What spirit
Is man can be

What spirit
Is the man can be



In “Spirit” – The Waterboys

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Poesia para os olhos 003

JP ®   
     ...a minha amiga Keiko... o nome dela em japonês significa "alegria" e contou-me que os pais a chamaram assim porque foi esse o intenso sentimento que o seu nascimento lhes trouxe... e eu acho também porque tem este imenso, puro e fácil sorriso (que não vejo já há alguns anos)... tenho saudades tuas, minha pequena amiguinha japonesa... miss you, Keiko...





domingo, 7 de abril de 2013

Pérolas 037

(...cada lobo tem a sua lua...;
uns abraçam-na todas as noites,
outros passam a vida uivando por ela...)

Pedro Abrunhosa c/ Rui Veloso (live)

Mais um dia que acaba
e a cidade parece dormir,
da janela vejo a luz que bate no chão
e penso em te possuir.
Noite após noite, há já muito tempo,
saio sem saber para onde vou,
chamo por ti, na sombra das ruas,
mas só a lua sabe quem eu sou.

Lua, lua,
Eu quero ver o teu brilhar,
lua, lua, lua,
Eu quero ver o teu sorrir.

Leva-me contigo,
mostra-me onde estás,
é que o pior castigo
é viver assim, sem luz nem paz,
sozinho com o peso do caminho
que se fez para trás...
Lua, eu quero ver o teu brilhar,
no luar, no luar.

Homens de chapéu e cigarros compridos
vagueiam pelas ruas com olhares cheios de nada,
mulheres meio despidas encostadas à parede
fazem-me sinais que finjo não entender.

(...e digo...)
Loucas são as noites, que passo sem dormir,
loucas são as noites.
Os bares estão fechados já não há onde beber,
este silêncio escuro não me deixa adormecer.
Loucas são as noites.

Leva-me contigo,
mostra-me onde estás,
é que o pior castigo
é viver assim, sem luz nem paz,
sozinho com o peso do caminho
que se fez para trás...
Lua, eu quero ver o teu brilhar

Não há saudade sem regresso, não há noites sem
madrugada,
Ouço ao longe as guitarras, nas quais vou partir,
na névoa construo a minha estrada.

Loucas são as noites, que passo sem dormir,
loucas são as noites.
Loucas são as noites, que passo sem dormir,
loucas são as noites...

In “Lua” – Pedro Abrunhosa

Pérolas 036





This girl I know needs some shelter
She don't believe anyone can help her
She's doing so much harm, doing so much damage
But you don't want to get involved
You tell her she can manage
And you can't change the way she feels
But you could put your arms around her


I know you want to live yourself
But could you forgive yourself
If you left her just the way
You found her


I stand in front of you
I'll take the force of the blow
Protection

I stand in front of you
I'll take the force of the blow
Protection


You're a boy and i'm a girl
But you know you can lean on me


And I don't have no fear
I'll take on any man here
Who says that's not the way it should be


I stand in front of you
I'll take the force of the blow
Protection


I stand in front of you
I'll take the force of the blow
Protection


She's a girl and you're a boy
Sometimes you look so small, look so small


You've got a baby of your own
When your baby's grown, she'll be the one
To catch you when you fall


I stand in front of you
I'll take the force of the blow
Protection

I stand in front of you
I'll take the force of the blow
Protection


You're a girl and i'm a boy (x4)


Sometimes you look so small, need some shelter
Just runnin round and round, helter skelter
And I lean on your fears
Now you can lean on me
An that's more than love
That's the way It should be
Now I can't change the way you feel
But I can put my arms around you
That's just part of the deal
That's the way i feel
I put my arms around you
 

I stand in front of you
I'll take the force of the blow
Protection
 

I stand in front of you
I'll take the force of the blow
Protection

You're a boy and i'm a girl (x4)


In “Protection” – Massive Attack ft. Tracey Thorn

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Pérolas 035




(Há perguntas que têm que ser feitas...)

Quem quer que sejas, onde quer que estejas
Diz-me se, é este o mundo que desejas?
Homens rezam acreditam, morrem por ti
Dizem que tás em todo o lado, mas não sei se já te vi
Vejo tanta dor no mundo, pergunto-me se existes
Onde está a tua alegria, neste mundo de homens tristes?
Se ensinas o bem, porque é que somos maus por natureza?
Se tudo podes, porque é que não pões comida à minha mesa?
Perdoa-me as dúvidas, tenho que perguntar
Sou o teu filho e tu me amas, porque é que me fazes chorar?
Ninguém tem a verdade, o que sabemos são palpites
Sangue é derramado, em teu nome é porque o permites
Se me deste olhos, porque é que não vejo nada?
Se sou feito à tua imagem, porque é que eu durmo na calçada?
Será que pedir a paz entre os Homens, é pedir demais?
Porque é que sou discriminado, se somos todos iguais?
Porquê?

Porque é que os Homens se comportam como irracionais?
Porque é que guerras doenças matam cada vez mais?
Porque é que a paz não passa de ilusão?
Como pode o Homem amar com armas na mão?
Porquê?
Peço perdão pelas perguntas que tem que ser feitas
E se eu escolher o meu caminho será que me aceitas?
Quem és tu? Onde estás? O que fazes? Não sei
Eu acredito é na paz e no amor

Por favor, não deixes o mal entrar no meu coração
Dou por mim a chamar o teu nome, em horas de aflição
Mas, tens tantos nomes, és Rei de tantos tronos
Se o Homem nasce livre, porque é que alguns são donos?
Quem inventou o ódio? Quem foi que inventou a guerra?
Às vezes acho que o inferno, é um lugar aqui na Terra
Não deixes crianças, sofrer pelos adultos
Os pecados são os mesmos, o que muda são os cultos
Dizem que ensinaste o Homem a fazer o bem
Mas no livro que escreveste, cada um só lê o que lhe convém
Passo noites em branco, quase sem dormir a pensar
Tantas perguntas, tanta coisa por explicar
Interrogo-me, penso no destino que me deste
E tudo o que me acontece, é porque Tu assim quiseste
Porque é que me pões de luto e me levas quem eu amo?
Será que é essa a justiça pela qual eu tanto reclamo?
Será que só percebemos quando chegar a nossa altura?
Se calhar desse lado está a felicidade mais pura
Mas se nada fiz, nada tenho a temer
A morte não me assusta, o que assusta é a forma de morrer

Porque é que os Homens se comportam como irracionais?
Porque é que guerras doenças matam cada vez mais?
Porque é que a paz não passa de ilusão?
Como pode o Homem amar com armas na mão?
Porquê?
Peço perdão pelas perguntas que tem que ser feitas
E se eu escolher o meu caminho será que me aceitas?
Quem és tu? Onde estás? O que fazes? Não sei
Eu acredito é na paz e no amor

Quanto mais tento aprender, mais sei que nada sei
Quanto mais chamo o teu nome, menos entendo o que chamei
Por mais respostas que tenha, a dúvida é maior
Quero aprender com os meus defeitos, acordar um homem melhor
Respeito o meu próximo, para que ele me respeite a mim
Penso na origem de tudo, e penso como será o fim
A morte é o fim ou é um novo amanhecer?
Se é começar outra vez, então já posso morrer


“Ao largo ainda arde
A barca da fantasia
O meu sonho acaba tarde
Acordar é que eu não queria”


In “Que Deus ?” – Boss AC (c/ sampler de “O Pastor” – Madredeus)

segunda-feira, 1 de abril de 2013

Memórias do século passado IV – …o meu primeiro beijo (…Manuela I.)


…castanho… é a cor que associo ao meu primeiro beijo…

…ao meu “verdadeiro” primeiro beijo (“french kiss” ou beijo de língua), já que as beijocas na face ou de fugida nos lábios, em namoros envergonhados de infância não os posso considerar como tal… 

…castanho dourado das folhas do Outono que terminava, dos cor dos olhos e dos tons do cabelo dela…

…e castanho escuro da cor do chocolate…

…teríamos ela e eu, 11/12 anos… andávamos na mesma escola, mas não na mesma turma… morávamos no mesmo bairro, relativamente perto um do outro, embora só nos tivéssemos cruzado e falado um com o outro nos corredores ou no pátio, no intervalo ou, uma por outra vez, à saída no fim das aulas…

…Manuela era uma miúda gira, de olhar vivo, cabelos longos até pouco abaixo dos ombros e com um tom moreno de pele…

…nesse dia de manhã, de sol a prometer Primavera embora com uma brisa fresquinha no ar, fiz as poucas centenas de metros de casa até à escola como era costume, estranhando a quantidade de pessoas que estava aglomerada junto do portão principal…

… um reboludo colega de turma, o “Foca”, que andava quase sempre de fato de treino, veio a correr na minha direcção…

- não há aulas, caraças… – vibrava contente aos saltos com a mochila – não há água e vão fechar a escola…

…estranhei um pouco porque tinha tomado banho há meia-hora atrás e em minha casa, obviamente, havia água…

…já na escola, vim a saber que havia uma ruptura grave numa conduta qualquer ali perto e assim, por decisão do conselho directivo, não haveria aulas, para alegria geral…

…nesses tempos, os miúdos da nossa idade andavam à vontade na rua, diferente de hoje, e era aí que nos divertíamos mais, fosse qual fosse a estação do ano… assim, para quem não ia direito para casa, aquela manhã (inesperadamente livre) iria ser aproveitada para jogos, passeio e outras brincadeiras…

…a Manuela e eu tínhamos amigos comuns e saímos um grupo de uma trintena de raparigas e rapazes directos ao Centro Comercial da Portela (então a grande novidade nos arredores) e que, na época, era um dos primeiros e o maior do País… (comparando com os que existem agora, dá vontade de sorrir nostalgicamente…) 

…invadimos a pastelaria onde vendiam uns deliciosos croissants com recheio de chocolate e fomos saindo em pequenos grupos para os jardins do Seminário dos Olivais, ali próximo, pleno de verdura e recantos de aventura…

…ela e eu ficámos para trás, a subir uma ladeira no caminho, enquanto começava a cair uma chuva miudinha…

…eu a equilibrar a minha sacola ao ombro e o croissant quase a escaldar de tão quente, ainda embrulhado, numa mão… ela, poucos metros à minha frente, com os livros e o caderno, apertados contra o peito e já a deliciar-se com o chocolate a desfazer-se na boca…

…olhou para trás na minha direcção enquanto caminhávamos… soltei um riso infantil…

- que foi ? – perguntou intrigada…

…apontei-lhe para o rosto e passei com o indicador junto do meu queixo, tentando-lhe fazer entender com o gesto o fio de chocolate que lhe corria devagar pela cara…

…passou com o dedo mindinho, junto do lado direito dos lábios…

- do outro lado… - sorri-lhe…

…quando ia fazer o movimento para limpar o local que lhe indicara, o bolo escorregou-lhe da mão e na tentativa de o agarrar, estatelou-se na relva húmida do terreno inclinado…     

…aproximei-me mais e baixei-me junto dela…

- magoaste-te…?

- não – respondeu, enquanto lhe ajudava a apanhar os livros e o caderno e ela olhava triste para o croissant, quase inteiro, no chão, coberto de terra e erva…

…a chuva começou a cair mais intensa e ainda estávamos algo distantes do nosso destino…

- anda – dei-lhe a mão para a ajudar a levantar – senão ficamos encharcados…

…apressámos o passo até debaixo de um jovem pinheiro-manso, um pouco acima…

…pousei a minha sacola e ela colocou as coisas dela por cima… afastou o cabelo molhado, colado na face… desembrulhei o meu bolo, tirei metade e estendi-lhe o resto dentro do papel da confeitaria…

…pestanejou, abanando subtilmente a cabeça…

- dividimos…dá prós dois – retorqui…

- obrigado – aceitou, de sorriso envergonhado…

…acercámo-nos mais do tronco rugoso da árvore e também um do outro, com as gotas de água a cair, como agulhas transparentes, em redor… ambos degustando a guloseima...

- outra vez… - disse-lhe quase me engasgando, tal era a vontade de rir…

…desta vez acertou logo com o sítio, limpando o chocolate liquido do canto da boca, com um guardanapo de papel…

- e olha quem fala… – apontou-me para a cara, rindo também com o olhar…

…tinha terminado a minha metade e estava com os dedos com restos de chocolate desfeito, fazendo menção de tentar limpar os lábios…

- espera…eu limpo… - aproximou-se ainda mais de mim, quase lhe sentido a respiração…

…passou o absorvente guardanapo, pelos cantos da minha boca, eu de olhos fixos nela, ela de olhos fixos nos meus lábios… humedeceu-o depois com a ponta da língua e limpou devagar o meu queixo…

- tens mais um bocadinho aqui – disse, desta vez olhar preso no meu…

…a limpeza estava mais que feita, mas ela continuou um pouco mais a passar o papel por cima do lábio inferior…

…sentíamos o hálito um do outro a misturar-se num só, tão próximo que estávamos, ela com uma mão encostada no meu peito, eu encostado contra o tronco do pinheiro e sentindo uma das pernas dela encostada na minha…

…em poucos segundos que pareceram muito mais que isso, continuamos a olhar um para o outro, sem dizer nada…  ela com o guardanapo, enrolado num dedo, suspenso junto do meu queixo, eu a engolir em seco…

…hesitantes e em silêncio, aproximámos os lábios entreabertos…um simples toque primeiro…depois outro, olhos cerrados… sentimos as línguas tocarem uma na outra, indelevelmente…depois mais um pouco, enroladas pela primeira vez… senti um suspiro profundo, não sei se dela, se meu, se de ambos…

…e depois, um turbilhão lento de sabor quente e húmido…um batimento intenso no peito…a mão dela que pousou suave atrás do meu pescoço… a minha mão acariciando-lhe a face  e o lóbulo da orelha… uma torrente de estrelas cadentes no céu azul escuro duma qualquer noite de ar sereno...

…que sensação maravilhosa… (…e que adoro repetir sempre na minha vida…)

…o sol conseguiu uma aberta entre as nuvens e incidiu sobre nós…devagar, descolámos os lábios, abrindo os olhos…encontrei-a de olhar baixo mas brilhante, sorriso tímido… eu devia estar com um sorriso de orelha a orelha e também o mais aparvalhado do mundo…

…levantei-lhe o queixo, encarando-a de novo… deu uma risadinha de menina…afastei-lhe o cabelo que teimava em esconder-lhe o rosto… sorri-lhe de volta…e voltámos a mergulhar naquela nova descoberta mútua… menos inibidos agora, instintivamente explorando-nos em carícias…           

…acabámos por regressar a casa sem ir ter com o resto do pessoal da escola… caminhando devagar e com um sentimento cúmplice…parando de vez em quando, em qualquer lugar possível para nos protegermos da chuva…e para, repetidamente, voltar de novo a experimentar a novidade do sabor e do toque um do outro…

…à noite não consegui pegar logo no sono, espírito de menino inquieto, revivendo tudo na minha cabeça…

…adormeci tarde com um paladar doce de chocolate na boca…     


JP ®